domingo, 26 de maio de 2013

O SIMPÓSIO BRECHT - Por Caroline Falero

Do dia 20 a 23 de maio aconteceu na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, por meio do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas e do Departamento de Arte Dramática o 14º Simpósio da International Brecht Society, sob o tema “O espectador criativo: colisão e diálogo”. Três integrantes do Trilho tiveram a oportunidade de acompanhar o simpósio. Segue abaixo o relato de Caroline Falero, integrante do Trilho:

Simpósio Brecht

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O mais importante de tudo é aprender a estar de acordo
Muitos dizem sim, mas sem estar de acordo
Muitos não são consultados
E muitos estão de acordo com o erro
Por isso, o mais importante de tudo
é aprender a estar de acordo”.
(Bertolt Brecht. Aquele que diz sim e Aquele que diz não.)

Inicio meu texto com esse fragmento da peça didática de Bertolt Brecht por achar pertinente essa colocação, afinal era um simpósio, um espaço de discussão, muito se diz que falar de Brecht sem questioná-lo é traí-lo e várias foram as posições referente ao trabalho dessa figura tão relevante para o teatro moderno e para o teatro do Grupo Trilho de Teatro Popular. A peça didática também acabou sendo grande protagonista do simpósio ao lado do teatro de Boal e a performance. Se tivesse que resumir em uma palavra o evento não hesitaria em escolher CONTRADIÇÃO. Simpósio tão recheado dela como a vida em que vivemos.
Dentre muitas passagens ao longo do período de 20 a 23 de maio destaco o pulsante relato de Miguel Rubio Zapata, sobre o trabalho do grupo Yuyachkani, a conferência generosa de Ingrid Koudella e o relato de Hans-Thies Lehmann agregado ao contraponto do comentário de Sergio de Carvalho questionando-o pela insistência em abafar o cunho político e marxista do trabalho de Bertolt, adorei o conflito, eis a oportunidade de aprendizado, não se chegou a consenso algum (que bom), seguiram discutindo na entrada do salão (em inglês), onde eu aguardava para tirar a foto com o diretor da Cia do Latão.
cartaz-brecht 1 No primeiro dia o universo conspirou a meu favor e tive a oportunidade de ver e fazer, mais uma vez, uma oficina proposta por Fran Teixeira, diretora do grupo Teatro Máquina, dessa vez sobre o Fragmento Fatzer intitulada Gesto e Narração, tudo a ver com a nossa nova montagem a cerca do egoísmo. Fran, mais uma vez foi pontual como o gestus brechtiano e estimulou de maneira prática o trabalho que dirijo atualmente no Trilho. Das mesas de comunicações, foram fundamentais “Da destruição à ressurreição: Baal revisitado” de Leo Munk, sobre outro personagem egoísta, Baal, a da própria Fran e sua tese de doutorado “Peça didática, experimento e choque: o Fragmento Fatzer de Brecht como nova forma de narrar” e a última rechiadíssima da tal contradição: “Gesto Citável e a Formação de Consciência no Teatro Político de Camila Harger Barbosa, no último dia. Passo a ser Daniel na jaula dos leões, e me divirto!
A fala de Camila, imprecisa e nervosa deixou a desejar sobre essa pesquisa que parecia tão interessante, ao concluir compartilhou com os presentes o fato de ter sido tirada do espetáculo Patrão Cordial por estar com um nenê que, naturalmente se manifestava. Uma menina presente elaborou e nos leu um escrito referente a isso, usando a manifestação da criança como metáfora para o encorajamento de um posicionamento desse público de teatro acomodado. Ironia ou não, estava eu como público a assistir o espetáculo... Em resposta ao escrito e sim, propondo o exercício do aprender a estar de acordo coloquei minha versão de espectadora incomodada com a intervenção da criança, deixei claro que nada tenho contra crianças (é claro!) e que muito menos apoio qualquer truculência em relação à forma como a mãe foi convidada a se retirar, pelo contrário, coloquei que ouvindo a contextualização dela, de mãe solteira e há quase um ano sem ir ao teatro me parecia essencial ela estar ali com a criança. Sigo falando que muitas das regras sociais existem para que se possa contemplar a todos, afinal aquele não é um espetáculo para crianças, não é? O pai da menina ficou cuidando da neta para que a mãe explanasse sobre sua pesquisa, a criança ao ver a mãe chorava e tornava impossível a permanência dos dois na sala, vô e neta saiam. O relato, obviamente não desceu bem. O conflitão tinha sido instaurado, eu, Daniel havia me jogado na jaula dos leões.
No segundo dia de simpósio aconteceu no intervalo para o café, uma performance de uma menina que lia seu texto de maneira exaltada aos que ali estavam e seguiram tomando seu cafezinho com bolachas, o texto era bem interessante, todos tinham cópias, ela seguia, tirava a roupa, ao concluir, a inflamação foi ao ápice ao contar a todos que ao conversar com os alunos da UFRGS, ficara sabendo que os mesmos não tinha permissão para utilizar o Salão de Atos, que este era apenas para cerimônias e eventos importantes. Ela questiona: e para que falar de Brecht então?
personalidades-dramaturgos-alemanha-brecht1 Pois e não é que essa mesma menina agora tinha chiliques sobre meu comentário? Ao ponto de não querer deixar eu me posicionar. Eu disse: Ok. Podemos ficar apenas com tua posição, pode ser?  - Sua amiga diz: espera, gostaria de ouvir sim tua posição – e assim segui enquanto os chiliques também seguiam. Ao concluir ainda perguntei a menina “mãe” de que maneira a pesquisa havia colaborado para a sua consciência política. No que eu acredito conter um pouco de rancor, ela me responde: No meu teatro. Meu pai é comunista e praticamente cresci dentro de uma biblioteca, isso responde a tua pergunta? Respondo: sim, responde (preciso urgente comprar mais livros para ter consciência política!).
Concluo por fim, que uma posição contrária foi geradora de tamanha e maior inquietação do que um texto (bem escrito, repito) gritado e roupas tiradas. Que bom! A menina da performance ficou tão incomodada que seguiu na última conferência (antes de iniciá-la, obviamente) a reclamar de mim.
O público e o povo precisam gritar, sim!!!! Contra o mau serviço de educação, saúde, transporte, contra a corrupção, pastores homofóbicos e para todas as séries de injustiças sociais que povoam nesse sistema capitalista decadente e sanguessuga! Esse mesmo sistema que aliena e nos faz pensar que uma criança se manifestando em um espaço estruturado para adultos é um ato de coragem. Para mim, naquele momento, a coragem estava no exercício de saber escutar, pois um grupo relevante estava convidando o espectador atento a se posicionar sobre esse mesmo sistema que todos deveríamos combater. E gritar e não ouvir é tão contraditório quanto à própria vida.

Um comentário:

  1. Carol, Brecht não é teoria, é praxis. Tu és Brecht, Brecht, Brecht, podes crer!
    Beijo grande.
    Ana Campo.

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