"O Baú- Lembranças e Brincanças" do Grupo Trilho de Teatro Popular de Porto Alegre se configura como uma pequena obra prima.
O espetáculo é o primeiro encontro do Grupo Trilho com o público infantil, e esse encontro é potente e torna-se uma grande celebração, uma troca verdadeira entre palco e plateia. "O Baú" se utiliza de uma estrutura dramatúrgica bastante simples aparentemente, mas que ao decorrer do espetáculo se revela potente e complexa, por colocar em cena a história de duas meninas que lutam para vencer o tédio. O texto é repleto de méritos, pois além de trazer a tona uma série de brincadeiras nostálgicas que remetem as crianças de hoje, as crianças que fomos, consegue nos trazer jogos e significados que me remetem aos jogos de aprendizagem, pratica de Brecht, digamos o mentor e guia do Grupo Trilho.
Como já conheço a prática do grupo, estava ansioso para ver como que seria a inserção de uma possível estética brechtiana e de temas políticos num espetáculo infantil. Minha ansiedade transformou-se em êxtase, ao ver que a dramaturgia triunfa ao conseguir trazer a tona diversas questões que criticam o mundo atual, através da ótica de duas crianças, temas que não deixam de criticar a atual infância, mas que se utiliza de sutilezas, tornando toda a narrativa leve e engraçada.
A encenação é simples, ágil, despojada, os cenários são poucos, mas estão a serviço da cena, destacando-se a grande janela que auxilia na ambientação do sótão. Os figurinos são simples, mas condizentes com a proposta. A iluminação de Bruna Immich é pontual, pois delimita e caracteriza o espaço da encenação e ainda atua como um alerta nas cenas de narrativa, mostrando para nós que a cena ao qual estamos assistindo é teatro, é teatral, ora entramos na história, ora retornamos para a realidade, e esse corte é essencial para um maior entendimento deste jogo. A trilha sonora de Sérgio Baiano é uma delicia e auxilia muito na ambientação da cena.
O grande mérito da direção foi o de não desmerecer a inteligência do espectador, criando uma cena aberta, utilizando-se de elementos do teatro épico e didático que caracteriza-se pela narração e o diálogo direto com o espectador, onde as atrizes despidas de suas personagens nos apresentam suas histórias, lembranças e memórias. O espetáculo diverte e faz pensar, não se limitando a explicar o mundo, ou até mesmo transformá-lo, mas através da cena propõe uma tentativa de mudança de ótica, abandonando qualquer tipo de tom panfletário ou educativo.
As duas atrizes estão ótimas em cena, triunfam e conseguem de forma verdadeira dar vida a Dindim e Pimpolha. A cumplicidade que existe entre as duas é fundamental para o jogo proposto. Uma entrega muito grande diante do ritmo vertiginoso que o espetáculo tem. Mesmo dizendo que as duas estão ótimas, penso que em alguns momentos Caroline Falero consegue aproveitam melhor o jogo, se sobressaindo a sua colega Giovana Zottis, mas isto ocorre em alguns momentos, pois as duas atuações estão dentro de uma unidade que eleva a qualidade do trabalho.
"O Baú" se caracteriza por ser um trabalho onde cada artista envolvido executa sua função muito bem, resultando num ótimo trabalho, demostrando o bom momento que vive este jovem grupo gaúcho, que se continuar assim, ainda colherá muitos frutos.
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